Eu sempre tive muita afinidade com a culinária judaica. Gosto de pastrami, gefilte fish, lox, vareniks. A única coisa que detesto é aquele raio de molho de beterraba e raiz forte que as velhinhas dZ-Deli insistem em nos empurrar goela abaixo. Elas tem uma frase comum, quando eu recuso o tal molho: "Gefilte fish sem raiz forte não é gefilte fish". De fato não é; é um gefilte fish melhor. Mas já me acostumei e tenho minhas teorias de conspiração de que a raiz forte faz você perder a fome, e daí você come menos no bufê.
Eu gosto muito de ir ao Z-Deli da Alameda Gabriel Monteiro da Silva, principalmente porque dá para sentar do lado de fora para almoçar no sábado. A única coisa ruim é que Dona Lonka, a atual proprietária, está velhinha e, pouco a pouco, está deixando os negócios a cargo de sua estúpida filha. Certa vez comprei uns dez gefilte fish para levar para casa. Dona Lonka insistiu que eu levasse a raiz forte e proferiu a frase mítica. Por educação, resolvi aceitar. E a filha não se fez de rogada. Olhou com aquela cara de peixe morto e disse: "De graça..."
Juro que guardei o potinho de raiz forte por uma semana em casa, tomando sol de verão na lavanderia para devolver a ela. Mas acabei desistindo, porque ela nem ia lembrar da própria mediocridade.
Mas graças a Deus, à Torah, à Kaballah e à Madonnah, tenho encontrado bons judeus pelo caminho e acabei experimentando a sopa Borscht no VegeTao, o restaurante vegetariano da minha amiga Regina.
Gosto da versatilidade dessa sopa, porque pode ser servida quentinha nos dias frios e fria, no verão. E aqui em Manhattan, reduto dos judeus do mundo, resolvi tentar fazer a tal sopa para aquietar meu resfriado. Então, para cultivar a veia judaica que há em cada um de nós, aqui vai a Sopa Borscht. Dizem que cada um tem sua receita particular, variando os ingredientes. Eu fiz um "mix" com os ingredientes que julguei sensatos:
01 kg de beterrabas |
02 cenouras |
02 batatas |
03 tomates rasteiros maduros |
01 cebola |
Sal |
Pimenta do reino moída |
Azeite de oliva |
03 folhas de louro |
Ramos de funcho ou "dill" frescos |
Sour Cream (ou creme de leite azedo, em tupiniquim) |
1/4 de carne moída ou em pedaços |
Um montão de água |
03 colheres de sopa de vinagre de vinho tinto |
Cozinhe a carne para fazer um caldo de carne. Quando estiver cozida, despeje os legumes, o sal, a pimenta, o vinagre, o louro. Os legumes, bem como o alho e a cebola devem estar previamente ralados ou, se preferir, cozinhe todos eles em pedaços pequenos e bata tudo no liquidificador após. Quando os legumes estivem bem cozidos (o parâmetro de cozimento é a cenoura estar mole, porque é a mais dura de todas), pode acrescentar a carne e deixar cozinhar mais um pouco. No finalzinho, acrescente uns galhos de funcho.
Sirva em prato fundo ou cumbucas, acrescentando uma colher de sopa de sour cream no meio, para ser misturado depois e um galhinho de funcho para enfeitar.
Taí. Eu tomei e ficou deliciosa, deu um calorzão daqueles. Eu que sou órfão bilateral de avós, senti uma dessas avós judias ancestrais me oferecendo essa deliciosa sopa para sarar meu resfriado. Mas escondido dela, tomei um bom vinho: um natural wine, Les Foulards Rouges - Le Soif du Mal, composto de uvas Syrah e Grenache. Sabor suave, parece menos alcoólico do que é na verdade. Combinou com o "momento beterraba" da noite.
