Sunday, April 24, 2011

Intoxica Manauara: Pirarucu recheado com tomate cereja, maçãs, batata barôa, alho, cebola e caldo de tucupi cozido na Slow Cooker: um luxo só.


Manauaras do mundo, uni-vos! Ainda não superei a minha fase “amazônica”. Nessas idas e vindas, meu maior prazer nessas viagens tem sido comer as comidas de lá e, ao voltar, trazer um estoque de quitutes. Sem nem pensar, respondo que o maior tesouro da Amazônia é o pirarucu.
Já comi pirarucu de tudo quanto foi jeito: frito, assado, cozido, caldinho, empanado, seco, salmorado, em filé, em postas, em tiras e até “rocambolizado”. Ainda tem jeitos que eu quero inventar e hoje, pra celebrar a Páscoa, resolvi faze-lo de um jeito diferente: cozido na Slow Cook.
Prá quem não sabe, slow cook ou slow cooking, antes de ser uma panela, é um método de cozimento em baixa temperatura, por várias horas, o que torna os alimentos muito mais macios, tenros e saborosos. Pode-se utilizar esse método no fogo, no forno ou, graças aos encantadores inventores americanos, numa panela elétrica, chamada de Slow Cooker ou Crockpot. Comprei a minha por um preço ridículo numa liquidação na Macy’s em New York no ano passado e tenho feito pratos fantásticos com ela.
E agora chegou a vez do Monsieur Pirarucu. Sempre que vou ao Mercado Municipal de Manaus, chego sempre no final do dia, com o mercado quase fechando. Acabo pegando as peças com pressa e fugindo de lá, com medo de ser assaltado. Sem preconceito. São os “locais” que sempre me advertem dos perigos da região central da cidade e já fui seguido por uns tipos estranhos e acho que não fui assaltado por um triz. Gordo, branquelo, cara de turista português, dinheiro no bolso e várias sacolas de compras. Alvo fácil, fácil.
Mas, como estava dizendo, acabo escolhendo as coisas com pressa, vou logo pegando os últimos pedaços de lombo do peixe e me lasco para corta-lo aqui em São Paulo. Dessa vez fui mais esperto. Tratei de pedir para o peixeiro cortar o lombo num “tapete” bem mais fino pra que eu pudesse enrola-lo facilmente e fazer os meus deliciosos rocamboles.
Tratei de deixar o peixe, depois de descongelado e bem lavado, de molho no tucupi, o tal caldo feito da mandioca brava, acrescido de sal, alho, cebola picada e um copo de pinga. Pela manhã, estiquei a peça, coloquei lascas de duas maçãs, batata barôa ( pra quem não sabe, é como chamam a mandioquinha no Rio de Janeiro...), 06 dentes de alho com casca e tudo, uma cebola roxa picada, cravo, canela, cebolinha e 250g de tomates-cereja inteiros. Montei o rocambole e coloquei com cuidado dentro da Slow Cook. Despejei o tucupi do molho e completei com água, até cobrir o peixe.
O mais delicioso dessa panela é o fato de poder largar a comida lá, sem se preocupar se vai queimar, se tem que por mais água, porque ela vai cozinhando lentamente e o próprio alimento vai liberando seu líquido e, ao chegar em casa, várias horas depois, pode-se sentir o cheiro maravilhoso da comida espalhado por todo o ambiente. O peixe permaneceu em cozimento por umas 6 horas, mas acho que poderia ter desligado a panela antes, para que ele ficasse um pouco mais firme. Mas mesmo assim, ficou saboroso. Servi com banana pacovan (ou banana-da-terra) frita e arroz de coco, uma pimentinha e uma cervejinha... Tudo maravilhoso!
E de sobremesa... não poderia faltar o “tradicional” pudim de tapioca do Doutor Fofinho! Realmente um luxo que enche o buxo.


Sunday, April 10, 2011

Alunigógenos Alimentícios: hoje é dia de Pato no Tucupi.

Eu ainda não me libertei dos cipós encantados da culinária amazônica. Pelo contrário: cada vez tenho explorado e me deliciado mais com suas maravilhas e com a sua riqueza. Eu não sei como os patos foram para na amazônia; quem souber que me conte. Mas, de fato, o Pato no Tucupi é uma iguaria de sabor muito rico, de sabor único e capaz de fazer a mente delirar com a experiência quase alucinógena.

Pra quem não sabe, o Tucupi é um caldo retirado da mandioca brava, que necessita horas de cozimento e para eliminar seu conteúdo venenoso. Praticamente uma alquimia. Bendita seja. Na Amazônia eles usam Tucupi em tudo. No pato, nos peixes, no frango e sei lá mais o que. Tem um perfume que irradia pelo ar e um sabor muito particular, igualmente “perfumado”. É possível que se encontre nos grandes mercados de São Paulo, como o Mercado da Lapa e o Mercado Municipal do Centro, mas eu ainda tenho feito meus aportes quando vou a Manaus.



O Jambu, ou “pimentinha d’água” ou “agrião-do-pará” é uma planta encontrada nos igarapés e que não é cultivada; ela brota como erva-daninha e vendida nos mercados da região. Dizem que ela possui uma substância que tem parentesco com os ácidos contidos nas pimentas, e causam um adormecimento na boca que dilata as papilas gustativas e aumenta a percepção dos outros sabores. Dizem que ele também é usado na confecção de cremes “estimulantes do prazer”, vendidos em Sex Shops, mas desse “prato” eu ainda não provei. Mas ao contrário do que dizem, o jambu não é coisa exclusiva da Amazônia. Ele é encontrado em Ásia e na África, usada como tempero e remédio por chineses e também uma erva ritualística no candomblé africano. É uma erva associada a Oxum, a deusa do amor, da prosperidade e da fertilidade.

Bem, chega de milongas e vamos à receita do Pato no Tucupi. O pato é habitualmente uma carne mais saborosa e mais dura que o frango. Nas minhas intermináveis conversas com o Chef Google, descobri várias formas de “amolecer” o pato, mas a técnica mais formidável que conheci foi fazer a tal “Vinha d’alhos”, que é uma mistura de alho, limão, vinho branco e outros temperos que deixa a carne macia e saborosa.

Pegue 02 patos grandes. O ideal é pedir para o cara da avícola tirar toda a pele e cortar em pedaços para evitar desastres visuais. Eu costumo deixar a carcaça de lado, porque se aproveita pouco da carne e ninguém se sente muito à vontade para chupar ossinhos, coisa que eu adoro fazer. Mas costumo cozinhar tudo junto e separar essas partes “menos nobres” para fazer quiche ou risoto. O rabo do pato vai pro lixo, porque ninguém gosta de comer o rabo dele...

Vinha d’alhos

02 taças de vinho branco

05 dentes de alho picados

05 limões espremidos

Salsa

Cebolinha

Pimenta do Reino

Sal

Coloque o pato de molho na nesse caldo e complete com água até cobrir todo o conteúdo. Deixe por cerca de dez horas, coberto, na geladeira. Depois desse período, retire os pedaços do pato e cozinhe na panela de pressão. Tem gente que prefere assar o pato, mas eu acho que ele fica mais tenro e mais saboroso na panela. Deixe por 20 a 30 minutos cozinhando após a “pressão” e o pato estará quase dissolvendo. Retire o caldo e separe o pato. Esse caldo pode ser usado para fazer o “brodo” de um excelente risoto. Eu costumo congelar e fazer o risoto com os “restos” do pato.

Preparo do Tucupi

02 litros de tucupi

Alho

Cebola

Sal

Pimenta de bico

02 pimentas “ardidas” pequenas

Preparo do Jambu

Se o jambu estiver fresco, lave bem e use as folhas e os talos menores. Se estiver congelado, deixe descongelar antes e faça da mesma forma.

Num pouco de óleo, doure o alho e a cebola. Acrecente o tucupi e as pimentas, o sal e coloque pra ferver numa panela grande. Depois de uns 15 a 20 minutos de fervura, acrescente com cuidado para não desmanchar os pedaços de pato. Eu costumo usar a Wok, porque dá um visual bonito, porque fica tudo “térreo”. Quando levantar fervura, acrescente o jambu, dispondo com cuidado e afundando as folhas com um garfo ao redor da panela. Cozinhe por 20 minutos e está pronto para servir.

Arroz de Coco

Alho

Cebola

Sal

01 pacote de coco ralado

01 kg de arroz

100g de manteiga de garrafa (pode-se substituir por manteiga comum ou óleo)

Refogue na manteiga o alho e a cebola. Quando estiverem dourados, acrescente o arroz e cozinhe do jeito que está acostumado.



Pronto! O pato no tucupi é servido com arroz e com a deliciosa farinha d’água ou “ova”, uma farinha de mandioca torrada, crocante e fabulosa que pode ser cozida com manteiga de garrafa e fica ainda mais crocante.

Uma pimentinha sempre vai bem nesse prato. Mas o que eu prefiro é a pimenta-de-bico curtida no tucupi, vendida nos mercados regionais. E se enfartem de comer!

Para beber, deve-se tomar um pouco de cuidado. Acho que pela delicadeza do prato e para aproveitar melhor os sabores, bebidas leves, como cerveja ou vinho branco são mais recomendadas. Como o jambu ressalta muito os sabores, recomendo que as cervejas sejam de garraja, para não sentir o gosto do alumínio, coisa totalmente anti-indígena!